26 de fevereiro de 2010

Governo paga a dentistas com cheques 'carecas'

Governo paga a dentistas com cheques 'carecas'

Estado deve dezenas de milhar de euros a milhares de médicos de todo o país. Há profissionais a passar mal

MIGUEL GONÇALVES

Há milhares de dentistas, sobretudo no Norte e Centro do país, a quem o Estado deve dezenas de milhar de euros, desde o ano passado, por serviços prestados no âmbito dos cheques-dentista. Os lesados, indignados, dizem que os cheques do Governo são "carecas".

"Conheço colegas, em início de carreira, que estão a passar muito mal, porque, não tendo ainda clientela, contavam com os cheques-dentista para pagar despesas fixas decorrentes do exercício da actividade. Só que, como o Estado é o primeiro a dar o mau exemplo, é mau pagador, esses colegas não têm, agora, como pagar, até, os materiais usados com os pacientes enviados pelo Ministério da Saúde", assegurou, ao JN, um médico do Porto, a quem a Administração Regional de Saúde do Norte deve cerca de seis mil euros, desde Outubro de 2009.

O JN contactou o Ministério da Saúde, administrações regionais de saúde (ARS) do Norte, Centro, Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve e a Ordem dos Médicos Dentistas para apurar os valores totais em dívida, desde a criação do cheque-dentista, em Junho de 2008. Porém, só a ARS de Lisboa e Vale do Tejo, a menos contestada, revelou: 178.960 euros.

As ARS que pagam pior são as do Norte e Centro. As que pagam melhor são as do Algarve, Alentejo e Lisboa e Vale do Tejo.

Há médicos na Região Norte que, até hoje, ainda não receberam qualquer serviço prestado no âmbito dos cheques-dentista. A maior parte, no entanto, não recebe desde Outubro de 2009.

A João Pedro Oliveira, da Clínica do Cértoma, em Anadia, a ARS Centro deve, desde há meio ano, cerca de dez mil euros. A Ana Lampreia, da Clínica Supermed, a ARS Alentejo deve cerca de 800 euros. Mas os exemplos são mais do que muitos. O JN ouviu mais de meia centena de dentistas e todos se queixam de pagamentos "incompreensivelmente tardios".

Ana Filipa, de Braga, diz que numa das clínicas onde atende, desde Julho de 2009, pacientes com cheque-dentista, a ARS Norte nunca lhe chegou a pagar qualquer serviço.

Maria José Cameira, de Faro, critica a burocracia conducente aos pagamentos e diz que demora menos tempo a atender alguns pacientes do que a preencher os seus formulários.

André Neto, da Clínica Sorriso Alfacinha, em Lisboa, diz que o que costumam ter em dívida consigo dá para pagar a uma funcionária e que se tivesse de viver com o dinheiro dos cheques-dentista "já tinha morrido". Rita Barroso, de Coimbra, queixa-se de não receber desde Outubro de 2009.

Ao JN, Filomena Lages, da ARS Centro, reconheceu ter facturas por pagar com cerca de quatro meses, mas atribuiu parte da culpa aos médicos, que "preenchem incorrectamente os formulários". Antonino Leite, da ARS Norte, atribui a "culpa" ao volume de trabalho.

24 de fevereiro de 2010

Inês de Medeiros deverá ter de pagar viagens a Paris

Inês de Medeiros deverá ter de pagar viagens a Paris

Publicado em 24 de Fevereiro de 2010

Actriz eleita pelo PS pode não ser equiparada a deputada eleita pela Europa. Se assim for, terá de tirar dinheiro do bolso para ir ver os filhos

Inês de Medeiros, deputada socialista, pode vir a ser obrigada a pagar os bilhetes de avião para se deslocar ao fim-de- -semana a Paris, onde morava antes de ser eleita para o Parlamento e onde vivem os seus filhos. Isto acontece porque a maioria dos membros do conselho de administração da Assembleia da República mantém grandes resistências em equiparar a actriz eleita pelo PS no círculo de Lisboa a um deputado eleito pela Europa, soube o i. Os deputados eleitos pelo círculo da Europa têm direito a viagens semanais ao círculo eleitoral, enquanto os eleitos pelo círculo de fora da Europa podem ter acesso, se o desejarem, a duas viagens por mês.

A solução de transformar Inês de Medeiros numa deputada eleita pelo círculo da Europa para efeitos de pagamento de viagens foi proposta pelos serviços da Assembleia. No entanto, os deputados da oposição argumentam que a morada declarada para efeitos de candidatura nas legislativas foi a freguesia de Santa Catarina, em Lisboa. Que morada vale afinal? O PS defende que a morada fiscal - Inês Medeiros paga impostos em França - poderia ser a fórmula para proceder às ajudas de custo. Na última reunião, o socialista José Lello, que preside ao conselho de administração, argumentou que inviabilizar a deslocação semanal a Paris de Inês de Medeiros põe em causa a livre circulação dos cidadãos europeus. No entanto, outros argumentam com a abertura de um precedente: e se qualquer outro deputado eleito por um círculo nacional decidir ir viver para fora do país? Ou se a maioria dos deputados decidir fazê-lo? A Assembleia deve pagar todos os bilhetes das viagens de fim-de-semana?

Na impossibilidade de chegar a um consenso, o conselho de administração decidiu ganhar tempo e pedir aos serviços da Assembleia um estudo de direito comparado, para que os deputados saibam como são resolvidas situações idênticas noutros países.

O que Inês de Medeiros requer ao Parlamento é o pagamento de uma viagem semanal a Paris em classe executiva e ajudas de custo relativas aos 25 quilómetros de distância entre a sua casa e o aeroporto. Todos os deputados beneficiam de ajudas de custo referentes às viagens que fazem entre o Parlamento e a sua residência. O valor do quilómetro é o que está em vigor para todos os trabalhadores da função pública: 40 cêntimos. Naturalmente, um deputado residente em Bragança tem ajudas de custo mais elevadas que um deputado residente em Santarém. Se o deputado não for eleito pelo seu círculo de residência, tem direito suplementar a duas viagens quinzenais para se deslocar ao círculo.

A próxima reunião do conselho de administração da Assembleia está marcada para a semana que vem. Só então os deputados vão ser obrigados a dar o seu parecer sobre o caso Inês de Medeiros. No entanto, a última palavra cabe ao presidente da Assembleia da República. Não se sabe o que Jaime Gama decidirá sobre este caso, mas conhece--se o que já decidiu, logo no início da legislatura: acabar com a possibilidade de os deputados desdobrarem bilhetes de avião, fazendo-se acompanhar dos cônjuges em viagens parlamentares. Todos os deputados têm direito a viagens em classe executiva, mas estava no regulamento que poderiam, com o valor correspondente ao seu bilhete em executiva, comprar dois em classe económica. Isto deixou de acontecer desde o final de 2009.

23 de fevereiro de 2010

PT paga indemnização milionária

23 Fevereiro 2010 - 00h30

Renúncio de mandato

PT paga indemnização milionária

Rui Pedro Soares, que renunciou ao mandato após a divulgação das escutas do caso ‘Face Oculta’, vai receber da PT uma indemnização de 600 mil euros.

Rui Pedro Soares, o administrador da PT que renunciou ao mandato na sequência da divulgação das escutas do caso ‘Face Oculta’, vai receber da PT uma indemnização de 600 mil euros como compensação financeira pelos salários não recebidos até ao final do mandato. Ontem, Fernando Soares Carneiro, representante do Estado na gestão da PT, como era Rui Pedro Soares, renunciou também ao mandato, que terminava em 2011, e será também indemnizado.

Ao que o CM apurou, Rui Pedro Soares recebia por ano na PT 2,5 milhões de euros, entre remunerações fixas e variáveis. A PT não comenta à indemnização dada a Rui Pedro Soares, até porque na semana passada Henrique Granadeiro e Zeinal Bava, presidente e líder da comissão executiva da PT, deixaram claro que a empresa 'nunca comentou ou transmitiu fora da sede própria, que é a divulgação de informação ao mercado, as condições de remuneração dos seus órgãos sociais, não fazendo qualquer sentido que abra uma excepção no presente caso'.

Em regra, quando há renúncia ao mandato não há lugar a indemnizações, mas é habitual as empresas negociarem com os trabalhadores a atribuição de uma compensação. É à luz desta prática que Rui Pedro Soares, que é quadro da PT desde 2001, e Fernando Soares Carneiro, que abandona o grupo, obtiveram uma indemnização da PT. Rui Pedro Soares permanece no Grupo PT, como director, com o salário mensal de quase dez mil euros.

Ontem, Fernando Soares Carneiro garantiu que a sua renúncia ao cargo na PT não está relacionada com o negócio de aquisição da TVI: 'Como já muitos terão reparado, nenhum dos episódios referidos, ou qualquer outro dos divulgados pela Comunicação Social, me liga ao falhado processo de aquisição da TVI pela PT, com o qual nada tive a ver.'

Por isso, Soares Carneiro foi categórico: 'Não renuncio ao cargo de administrador da PT SGPS para defender a honra hipoteticamente manchada. Na realidade, a minha honra profissional é um bem sólido, com quase 40 anos de prestigiada carreira, e a minha honra pessoal é algo que eu não dou azo a que seja discutido na praça pública.'

Henrique Granadeiro e Zeinal Bava enalteceram o empenho com que Soares Carneiro exerceu as suas funções na PT.