Desde 2005, mais de metade da perda de receita é por prescrição. Ao todo vale 3% do PIB.
O governo de José Sócrates anulou ou deixou prescrever um total de 5,3 mil milhões de euros em impostos desde 2006, inclusive, o equivalente a 3,2% do produto interno bruto a preços do ano passado. Deste valor, mais de metade (56% ou três mil milhões de euros) diz respeito a prescrições - dívidas cujo prazo de cobrança caducou de forma definitiva. Morosidade das decisões, leis que requerem processos muito complexos, acumulação de muitas e pequenas dívidas são algumas das causas apontadas pelos fiscalistas. Mas há outras.
A Conta Geral do Estado (CGE) relativa a 2009, publicada anteontem à noite, revela que o Fisco anulou dívidas fiscais no valor de 560,5 milhões de euros e declarou prescritos outros 572,6 milhões. Refere ainda que, no final de 2009, havia 14,2 mil milhões de euros por cobrar, um valor que está a descer lentamente desde 2006, mas que ainda assim daria, só por si, para limpar o défice público recorde registado no ano passado.
Os técnicos das Finanças, responsáveis pelo documento, explicam que a anulação de liquidações de impostos ocorre quando o Estado "detecta a existência de uma liquidação indevida, por iniciativa própria, através de processo gracioso ou por impugnação do devedor". Quando a razão é do contribuinte, o imposto em falta tem de ser anulado, integral ou parcialmente. Já a prescrição traduz-se num processo mais grave de perda fiscal: é definitivo e pelas piores razões. Este fenómeno ocorre maioritariamente no IVA, e ano após ano.
Os fiscalistas, no relatório para o estudo da política fiscal, apresentado em Outubro de 2009, tentam explicar as causas que levam às prescrições nos impostos: segundo eles, existe um bloqueamento nos processos de crime fiscal. Os sete especialistas de renome dizem que "a criminalização de tudo acaba por absorver os recursos do Ministério Público e dos tribunais com processos de montantes pouco significativos, parecendo preferível aplicar coimas adequadas e libertar aqueles departamentos para a investigação e punição das grandes fraudes". "A defesa de limiares baixos acaba por ser uma preciosa ajuda aos grandes defraudadores, dado o bloqueamento dos tribunais e o risco acrescido de prescrição", apontam. Apadrinham, por isso, uma ideia da procuradora Maria José Morgado que defende "a criação de um tribunal de pequena instância fiscal, com um processo simplificado, para julgar de forma rápida, num prazo máximo de 30 dias, a grande velocidade e em grande quantidade, este tipo de processos, sob pena de prescrição".
O prazo de prescrições das dívidas fiscais, que era de 20 anos, passou em 1991 para dez anos e em 1999, com a entrada em vigor da Lei Geral Tributária, passou para 8 anos. A expiração do prazo legal para cobrar dívidas costuma ser o principal motivo para a prescrição.
Mas há outras causas. Na CGE, as Finanças defendem que as dívidas fiscais também têm expirado por não existirem "quaisquer bens ou rendimentos por parte dos devedores ou responsáveis subsidiários que assegurem a possibilidade de cobrança coerciva"; devido a "novas formas de fraude e evasão com recurso à interposição de sociedades que não possuem qualquer património (...) e em que por isso existe logo de início a dificuldade/impossibilidade de cobrança coerciva dos impostos"; e porque são impostos devidos por empresas invisíveis "sem qualquer estrutura (imóveis, equipamentos...) que recorrem à subcontratação (outsourcing) para exercer a sua actividade". O governo lembra, ainda assim, que a ocorrência das prescrições é "inevitável e intrínseca a qualquer sistema fiscal".
Os montantes prescritos compõem a maioria das dívidas declaradas como prescritas em 2008 - já o haviam sido em anos anteriores - sem que contudo, tivessem sido eliminadas dos sistemas por escassez de recursos humanos.
Os impostos anulados e prescritos relativos a toda a primeira legislatura de Sócrates deverão ser até superiores, mas não existem dados disponíveis de 2005 inclusive para trás.
FONTE: http://www.ionline.pt/conteudo/67420-governo-deixa-fugir-mil-milhoes-euros-ano-em-impostos
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