7 de maio de 2010

Pecados capitais. Estes Papas não foram para o Céu

O livro "História dos Papas" prova que os homens da igreja não foram todos santos.

Sem papas na língua

Que atire a primeira pedra quem nunca pecou. Os linchamentos de pecadores foram apanágio da Igreja ao longo dos séculos. Mas a carne é fraca e o mundo depressa percebeu que nem os descendentes de Simão Pedro (ou S. Pedro), o primeiro Papa, escapam a tentações.

Depois de séculos de vidas escabrosas, Juan Laboa Gallego quis pôr por escrito o bom, o mau e o feio da Igreja. E assim nasceu "História dos Papas". Em Lisboa o sacerdote espanhol falou ao i de como quis fazer deste livro um "relato histórico com verdade", e não um "pedido de desculpas com ocultações".

Gallego admite que, à falta de interesse por mergulhar nas 500 páginas, o leitor deve saltar para as últimas e conhecer os dois últimos homens do Vaticano ("enfrentaram problemas que são os nossos") e reconhece que, de Gregório Magno a João XXIII (o seu favorito), houve "papas bons e papas santos, papas medíocres e papas maus". A começar por estes sete, acrescentamos. Entre eles cometeram todos os pecados capitais e provam de uma vez por todas que o hábito não faz o monge.

01 Estêvão VI (896-897)
Pecado: Ira


Quando, no ano 590, o Papa Gregório I listou os sete pecados capitais, ordenou--os do pior para o menos mau. A ira vinha em terceiro, mas só porque o Papa não viveu para assistir a "um dos espectáculos mais vexantes e degradantes de uma história não carente de cenas desconcertantes", diz o autor.
O ódio de Estêvão VI a Formoso, seu antecessor, era tão "obsessivo e incompreensível" que o levou a ordenar que, nove meses depois de ter morrido, o cadáver fosse desenterrado para ser castigado. Os pajens cobriram-lhe o corpo com as vestes e riquezas pontifícias e sentaram-no no trono para que o seu pontificado fosse anulado. "Toda esta macabra cerimónia", descreve Gallego, "teve a aparência de um julgamento: um tribunal foi acusando o cadáver e um diácono junto do mesmo foi respondendo em seu nome." Depois foram-lhe cortados os três dedos da bênção e o seu corpo atirado ao rio Tibre.
Quis o destino que, meses depois, uma revolução popular - "alentada por tanta loucura e insensatez", lê-se - levasse Estêvão à prisão, onde foi morto por estrangulamento.

02 João XXI (1276-1277)
Pecado: Preguiça


Não é preciso ser católico fervoroso para saber que só houve um Papa português. E a ironia é que é a preguiça o pecado capital que se cola melhor à figura dele. No seu curto pontificado, João XXI foi acusado pelos religiosos de não os estimar e de não trabalhar com afinco pela Igreja. No final do mandato chegou a ser apelidado de Anticristo por muitos deles - os mesmos que falariam em castigo divino quando o tecto da residência lhe caiu em cima e o matou, durante o sono.

03 Sisto IV (1471-1484)
Pecado: Inveja


"Desmedidamente nepotista, elevou a cardeais quatro dos sobrinhos, casou outros com membros das famílias principescas e repartiu entre eles abundantes bens e postos relevantes." Noutras circunstâncias, a descrição do papa que autorizou a Inquisição poderia parecer a de um homem bondoso. Mas não. Por inveja a todos os que o rodeavam, a missão do italiano Sisto IV foi "assegurar um futuro brilhante a uma família sem perspectivas previsíveis". Reza a história que se compadeceu das vítimas da Inquisição quando se apercebeu das torturas ordenadas por Fernando e Isabel e pelo cardeal Rodrigo Borja. "Não há pois que culpá-lo dos excessos do tribunal", defende Gallego. "Mas", admite, "não deixa de surpreender que, preocupando-se tão pouco com as virtudes, a moralidade e o ideal evangélico, este Papa se lançasse a castigar os culpados de pecados certamente não maiores que os que todos os dias se cometiam ao pé dele." Ainda assim, é a ele que temos de agradecer a criação de obras como a Capela Sistina.

04 Alexandre VI (1492-1503)
Pecado: Luxúria


Juan Gallego é o primeiro a reconhecer que Alexandre VI é um dos papas mais pecadores da história. "Foram ditas tantas coisas sobre o Papa Bórgia que já não se distingue bem a verdade do mito", explica o autor. "É o caso de um homem que foi um grande político e um muito mau papa." A sua Bula Alexandrina partilhou a América entre Portugal e Espanha. Entretanto, teve pelo menos nove filhos e conseguiu o papado graças às "atractivas e generosíssimas promessas feitas a quem votasse nele". Para ganhar dinheiro tanto vendeu cargos na Cúria como esfolou judeus abastados. Fez dos seus 11 anos de pontificado tempos de fausto e excessos no Vaticano, onde eram organizados banquetes, festejos e orgias. Foi musa do povo romano na criação dos versos: "Sexto Tarquínio, Sexto Nero e Sexto também este/Roma sob os Sextos sempre acabou em ruína."

05 Paulo II (1464-1471)
Pecado: Soberba


As más línguas dizem que morreu enquanto era sodomizado por um pajem, mas são rumores não confirmados. Amante apaixonado do luxo, a primeira coisa que fez quando foi ordenado Papa foi transformar a simples mitra papal numa tiara de ouro e pedras preciosas que instituísse o poder dos descendentes directos de S. Pedro. Para manter a ordem numa cidade que vivia inquieta, reinstituiu o sistema de pão e circo do Império Romano - assistindo aos desfiles populares de uma das janelas do seu palácio enquanto atirava comida e moedas à multidão.

06 Inocêncio VIII (1484-1492)
Pecado: Avareza


Foi o primeiro papa a apresentar ostensivamente os seus filhos ao povo cristão e inspirou Alexandre VI a ideia de vender os cargos da Cúria. Para se integrar na família Medici - a mais poderosa e prestigiada da época - casou um dos filhos com Catarina, uma das descendentes dos Medici. Em troca elevou a cardeal João Medici com apenas 12 anos (o futuro Papa Leão X, que inspirou as 95 teses de Lutero). Segundo descrições do cronista romano Stefano Infessura, no seu leito de morte Inocêncio autorizou que retirassem sangue a três crianças para transfusões. Nem ele nem os rapazes sobreviveram à façanha.

07 Bonifácio VIII (1294-1303)
Pecado: Gula


É um dos Papas mais famosos da história, eternizado pelo seu rival Dante na "Divina Comédia". O rol de acusações que lhe foram feitas ultrapassa o de qualquer outro papa: ateu, herético, amante da sodomia e violador de freiras, dizem que matou o seu predecessor, Celestino V, para subir ao trono papal. Tinha um apetite insaciável pelo poder. O desejo de engolir Roma para ser deus na Terra cegou-o. Segundo Laboa Gallego, "Tentou impor na sociedade do seu tempo um projecto teológico anacrónico, sem se aperceber de que os tempos tinham mudado tanto que já se tornava impossível pôr em prática a sua aspiração de domínio universal".

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