26 de maio de 2011

Sentença judicial arrasa argumentos de Sócrates sobre espiões de São Bento

O caso diz respeito a uma queixa-crime contra um jornalista que denunciou a utilização das secretas pelo primeiro-ministro. O tribunal decidiu que a notícia não era difamatória, mas sim um trabalho jornalístico fundamentado sobre um assunto de interesse público.

Num estado de direito democrático, todas as matérias, mesmo as secretas, são escrutináveis.? Rui Patrício
A notícia de caiu como uma bomba em Fevereiro de 2006. o jornalista Rui Costa Pinto escrevia, na "Visão", que "o primeiro-ministro está a criar um novo núcleo de serviços de informação, não previsto na lei e sem controlo do parlamento", que estaria sob a sua dependência directa.

O texto viria a merecer uma queixa por difamação de José Sócrates e do então secretário-geral do Serviço de Informações da República Portuguesa (SIRP), Júlio Pereira, contra o jornalista e o director da revista "Visão", Pedro Camacho.

A decisão da juíza Graça Pissarra, dos juízos criminais de Lisboa, dá como provados, entre outros pontos, que "os despachos de nomeação dos membros do gabinete do secretário-geral do SIRP não foram publicados no Diário da República", que "à data da reportagem, já havia decorrido mais de um ano desde a publicação da lei orgânica n.o 4/2004, sem que, no entanto, tivesse sido elaborada e publicada a respectiva regulamentação", que "nos cinco meses anteriores à publicação, num processo de renovação dos serviços de informações, os directores do SIS e do SIED, bem como o director da DIMIL, foram substituídos", que a experiência dos directores escolhidos na área dos serviços secretos, "nomeadamente no que diz respeito a questões operacionais, não era relevante" e ainda que, quando o artigo saiu, o chefe de gabinete do secretário-geral do SIRP e principal assessor político do primeiro-ministro eram quadros provenientes do SIS".

Tudo "falso" Além do primeiro-ministro e de Júlio Pereira, os directores do SIS e do SIED, Antero Luís e Silva Carvalho, disseram ao tribunal, respectivamente, que a notícia era "pura invenção" e que o texto era "mau, infame e completamente falso". Jorge Bacelar Gouveia, que fazia parte do conselho de fiscalização das secretas, classificou a prosa como "falsa", o chefe de gabinete de Sócrates nessa altura, Luís Patrão, disse que "a capa da revista dava a ideia de que se iria criar uma polícia política que fazia lembrar a antiga PIDE", classificando a notícia como "falsa". Augusto Santos Silva testemunhou por escrito, "reputando como falsas as imputações constantes do texto". Alberto Martins referiu que o texto em apreço imputando a Sócrates a criação de uma nova secreta é "falso, atentatório da honra do visado" e, por último, Pedro Silva Pereira garantiu que "a notícia em causa é completa e grosseiramente falsa".

Apesar dos testemunhos de "peso", a juíza considerou que "não se afigura que as expressões do texto [...] atinjam a honra e consideração dos assistentes" (Sócrates e Júlio Pereira). Além de voltar a referir que a lei orgânica do SIRP "não se encontrava efectivamente regulamentada, Graça Pissara salienta que se mostrou pacífico que "o SIRP respondia directa e politicamente perante o primeiro- -ministro e funcionava na presidência do Conselho de Ministros e que destacadas personalidades, como sejam deputados da Assembleia da República, manifestavam, à época, reservas quanto à actividade fiscalizadora do conselho de fiscalização". Concluía que o próprio Bacelar Gouveia reconheceu a falta de experiência dos membros.

O advogado de defesa, Rui Patrício, disse ao i que a sentença é importante para a liberdade de imprensa e conclui que "num Estado de direito, todas as matérias, mesmo as secretas, são escrutináveis".

FONTE: Jornal i

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