"Grande
parte dos crimes de corrupção são feitos a nível do poder central e
local na área do urbanismo. Um simples papel de desafectação de terrenos
de REN ou RAN pode valer milhões. E todos ficam reféns deste esquema".
Quem o diz é Paulo Morais, vicepresidente da Transparência
Internacional, que ontem preparava uma queixa para apresentar no DIAP
sobre o negócio denunciado pelo CM – um autarca de Matosinhos comprou
por quatro milhões vários lotes de terreno em Alfena, Valongo, e
vendeu-os, em menos de dez minutos, por 20 milhões. A investigação será
feita pela Polícia Judiciária que terá de apurar se houve corrupção,
tráfico de influências ou participação económica em negócio.
O
ex-vereador do Urbanismo na Câmara do Porto compara ainda estes
negócios aos crimes de tráfico de droga: "São mais seguros que os
negócios de tráfico de droga. Não são fiscalizados e rendem valores
idênticos. Geram 2 a 3 mil por cento de lucro", diz Paulo Morais.
O
caso de Valongo é paradigmático pela rapidez com que aconteceu. Jaime
Resende, da Assembleia Municipal de Matosinhos, comprou nove lotes numa
zona de reserva ecológica e, depois de juntar um documento da câmara
dando conta de que o espaço poderia ter capacidade construtiva, vendeu
os mesmos terrenos por 20 milhões, a um fundo imobiliário. Recebeu seis
milhões no acto de venda e o remanescente (14 milhões de euros) seria
pago numa segunda tranche.
PERFIL
Jaime
Resende, de 40 anos, dedica-se a negócios de compra e venda de
terrenos. Começou a trabalhar com Narciso Miranda ainda quando este era
presidente da Câmara de Matosinhos. Relacionou-se com o autarca nos
meios do PS, onde terá conhecido a mulher, Maria Manuela, sobrinha de
Narciso, que trabalhava na câmara.
TERRENOS GERAM CISÃO ENTRE AUTARCAS DO PSD
Em
2008, a proposta de alteração pontual do PDM para permitir a
desafectação dos terrenos em causa só teve o aval do presidente da
Câmara de Valongo, Fernando Melo, e do vereadora do Urbanismo, José
Pinto.
Os outros três membros da maioria PSD – o
então vice-presidente João Queirós, Miguel Santos e Mário Duarte –
abstiveram-se na votação, tal como os quatro eleitos do PS. Na altura,
Maria José Azevedo era a primeira vereadora socialista e recorda-se que o
processo gerou dúvidas. "Tinha contornos nebulosos, não havia plano de
pormenor, nem um contrato com os investidores", disse ao CM Maria José
Azevedo, que se mantém na autarquia de Valongo, como independente.
Contudo,
depois de passar pela aprovação da entidade que gere a REN e obtendo
vários pareceres favoráveis, a autarquia conseguiu ver aprovada a
desafectação dos terrenos de Alfena da zona de reserva ecológica.
ENRIQUECIMENTO DOS ENVOLVIDOS
Segundo
o vice-presidente da Transparência Internacional, Paulo Morais, as
populações são lesadas, sempre a favor do enriquecimento dos vários
intervenientes em negócios de compra e venda de terrenos comprados por
baixo valor.
INVESTIGADORES DEVIAM VIGIAR
Paulo
Morais defende que o MP devia vigiar estes negócios, para evitar
mais-valias astronómicas e a fuga aos impostos. "Portugal, nesta
matéria, não é um estado de Direito. Vigora a lei da selvajaria",
afirma.
LIDEROU VENDA DE 170 MILHÕES
Em
2005, Jaime Resende representou também várias vezes o grupo Ikea nas
negociações de terrenos com a Câmara de Matosinhos, à época liderada por
Narciso Miranda. O investimento do grupo sueco rondou os 170 milhões de
euros. Não se sabe quanto é que Jaime Resende lucrou com o negócio.
FONTE: Correio da Manhã
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